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sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

TRATAR DESIGUAIS DE FORMA IGUAL: O PRONAF EM ALAGOAS

Antonio Barbosa Lúcio
Universidade Estadual de Alagoas-UNEAL
Núcleo de Estudos Agrários e Movimento Sindical Rural em Alagoas-NEASR/2008
Pela lógica de organização do PRONAF, o processo de distribuição de recursos estaria vinculado a própria delimitação do proprietário rural enquanto trabalhador familiar. Em 2006 o senado federal[1] está em processo de aprovação que estipulem esses critérios para definição do que seria agricultura familiar. Em geral o que esta sendo estabelecido pela PLC 32/2006 são os mesmos critérios já estabelecidos anteriormente desde a aprovação do PRONAF não constituindo novidades ao que já fora estabelecido.


O Projeto classifica o agricultor familiar como categoria produtiva, de acordo com alguns parâmetros para enquadramento, tais como: não deter área maior do que quatro módulos fiscais; utilizar predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu empreendimento; ter renda familiar predominantemente originada de atividades econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento; dirigir o estabelecimento ou empreendimento com auxílio de pessoas da família. O projeto estabelece, ainda, a articulação das políticas da agricultura familiar com aquelas direcionadas à reforma agrária (MDA/NEAD, 2006).


Sendo assim, não havendo novidades quanto aos critérios para a designação do que seria agricultura familiar, nos voltaremos aqui a apresentar como estas condições podem ser destacadas no Estado de Alagoas enquanto justificativa para a alocação de recursos para o Estado.

Uma das primeiras condições para que o produtor familiar receba recursos, seria: possuir propriedades no valor de até 04 módulos fiscais ou desenvolver atividades agrícolas em forma de parceria e/ou arrendatário. Pelos dados do IBGE, podemos verificar que no Estado de Alagoas não houve relativa alteração na quantidade de estabelecimentos agrícolas. Em 1975, possuía 105.160 estabelecimentos chegando em 1995/1996 a 115.064 estabelecimentos. Houve manutenção da quantidade de proprietários em patamares semelhantes ao de 1970. Entretanto, no censo de 1995/96 houve queda da quantidade de arrendatários, aumento dos parceiros e de ocupantes[2].



Entretanto, se os dados relativos a condição de proprietários quase não demonstram diferenciação em duas décadas, dados quanto aos estabelecimentos segundo os grupos de área total (ha) em 1995 apontam a dimensão desses estabelecimentos. Ou seja, 92, 736 do total de estabelecimentos, segundo o IBGE, eram pertencentes ao grupo de menos de 10 ha. Por esses dados, levando apenas em consideração o critério de alocação de recursos de 04 módulos fiscais, a maioria absoluta dos estabelecimentos alagoanos estaria inserida nessa condição.


Entretanto, o Estado de Alagoas realizou em 2005, 35.066 contratos com um montante de R$ 68.631.671,17. Esses dados seriam expressivos se não houvesse tanta disparidade em relação os demais Estados do país, como por exemplo, o caso do Acre 4.765 contratos e recebeu R$150.483.033,46.


Não se está preconizando aqui o estabelecimento de formas igualitárias de alocação de recursos, mas a necessidade de políticas públicas que levem em consideração pelo menos os critérios impostos pelo governo federal para delimitar as áreas de atuação dos recursos governamentais. Faz-se necessário notar que não estamos defendendo que as disparidades de recursos entre as regiões devam ser sanadas com a alocação igualitária entre as regiões com os recursos já existentes. Temos ciência que são insuficientes para sanar a demanda de cada região. Entretanto, essas disparidades regionais, com os recursos existentes, apenas são explicitadas tendo em vista que as regiões Norte e Nordeste possuem maiores índices de miserabilidade do país. Portanto, pela mesma lógica que é estruturada as políticas públicas para o setor rural, estabelecidas através do decreto nº 3.991 de 30 de outubro de 2001, objetivando “implementar o aumento da capacidade produtiva, a geração de empregos e a elevação da renda, visando a melhoria da qualidade de vida e o exercício da cidadania dos agricultores familiares” pode-se atentar que as maiores desigualdades em relação a renda, qualidade de vida e, conseqüentemente, o exercício da cidadania, está numa região marcada historicamente pela quase ausência de políticas públicas que efetivassem melhorias para essa população. Conforme dados do IBGE, o Estado de Alagoas possui não apenas índices altíssimos de desemprego, mas disparidades entre os diversos Estados dessa região.

É importante notar que em relação aos dados desde 1995, período em que foram estabelecidas as formas tanto de definição do que seria agricultura familiar como a própria definição de quais seriam os recursos destinados a cada região, não houve significativas alterações nas condições de vida e de trabalho dos alagoanos que vivem em áreas rurais. Se tomarmos, por exemplo, o Estado de Alagoas, com maior índice de desemprego da região, é possível verificar que outros dados se agrupavam a essa situação de desemprego. A população apresentava um índice de analfabetismo entre pessoas com mais de 15 anos de 61,7 % em 1970 e de 55,1% em 1980. Este índice tendia a aumentar entre a população rural com 77,1 % e 71, 4, respectivamente,(...). Entre a faixa etária de 15 a 29 anos, no meio rural, o analfabetismo correspondia a 63,29% (LUCIO, 2003: 66). Somados a esses dados, a expectativa de vida no Estado Alagoano era, de 57 anos. A média nordestina era de 61 anos; a mortalidade infantil era de 78 por 1000, possuindo os maiores índices da região que era de 63 por 1000. Esses dados apresentados pela SUDENE (1997), foram apresentados em 1990/2000, pelo IBGE, podemos perceber que apesar de ter ocorrido crescimento negativo quanto a mortalidade infantil, o Estado de Alagoas ainda persistiu com a maior variação entre os Estados nordestinos. Essa situação é ilustrativa se levarmos em consideração que

"Tais dados convergem com a proporção da população ocupada que ganhava menos de um salário mínimo, em 1995. (...) 39,70 % da população ocupada em Alagoas recebia menos de um salário mínimo (R$ 140,00). Esse dado é superior ao índice alcançado em nível do país, que era de 22% e superior aos demais Estados nordestinos, como Pernambuco, Piauí, Sergipe, Bahia, Ceará e Rio Grande do Norte e, da própria região Nordeste como um todo, a qual revelou naquele ano que 36% de sua população ganhava menos de um salário mínimo (LUCIO, 2003:71)."


Portanto, se do ponto de vista das necessidades da população havia condições de que houvesse políticas públicas que almejasse sanar as condições de miserabilidade, como estabelece a legislação, do ponto de vista de interesses políticos, ideológicos e econômicos essa condição sequer foi levada em consideração, a não ser como forma de propaganda populista dos diversos governos desde a implantação do PROVAP no governo Itamar Franco, até os dias atuais. Além disso, a proposta do PRONAF, em 2001, assegurava a arregimentação de seus recursos para além da atividade tipicamente centrada na agricultura. Essa forma de conceber a utilização dos recursos pode ser expressa através do Decreto nº 3.991 de 30 de Outubro de 2001 que estabelece:

"Art. 5o Para os efeitos deste Decreto, são considerados beneficiários do PRONAF todos aqueles que explorem e dirijam estabelecimentos rurais na condição de proprietários, posseiros, arrendatários, parceiros, comodatários ou parceleiros, desenvolvendo naqueles estabelecimentos atividades agrícolas ou não-agrícolas(...)

Parágrafo único. São também beneficiários do Programa os aqüiculturas, pescadores artesanais, silvicultores, extrativistas, indígenas, membros de comunidades remanescentes de quilombos e agricultores assentados pelos programas de acesso à terra do Ministério de Desenvolvimento Agrário (DECRETO nº 3.991 de 30 de Outubro de 2001)."


O que poderia ser um reconhecimento por parte do Governo Federal de que atividades agrícolas ampliadas para aquelas relacionadas a sobrevivência de produtores familiares para além de atividades relacionadas a terra, se tornou, ao ampliar o leque de atendimento do PRONAF sem, em contrapartida, alocar recursos para atender a demanda existente em cada região, em objeto de negociação entre aqueles setores que possuem maior condição de negociação, ou seja, maior poder de pressão frente aos governos. Além disso, ainda estão embutidos os recursos destinados ao processo de organização da distribuição desses recursos.



[1] “CD: Apresentado em julho/2004, o projeto foi apensado ao PL 804/2003. Em julho/2005, dispensado por requerimento do autor e deferimento da Mesa Diretora, o projeto seguiu tramitação em separado, tendo sido despachado, sob apreciação conclusiva, à CAPADR e CCJ. Na CAPADR, sob relatoria do dep. Francisco Turra (PP/RS), foi aprovado em setembro/2005. Para relatoria na CCJ foi designado o dep. Jamil Murad (PCdoB/SP), no mesmo mês, cujo parecer favorável foi aprovado por unanimidade em dezembro/2005. Em março/2006 foi encaminhado ao Senado Federal (PLC 32/2006) (Fonte MDA/NEAD/2006)”.
[2] “Considerou-se produtor a pessoa física ou jurídica que detivesse a responsabilidade da exploração do estabelecimento, quer fosse o mesmo constituído de terras próprias ou de propriedade de terceiros. Os produtores foram classificados em proprietário, arrendatário, parceiro e ocupante (Fonte: IBGE - Censo agropecuário 1995/1996)”.

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