O DESCASO DA EDUCAÇÃO DO/NO CAMPO: AS DIFICULDADES ENFRENTADAS
POR PROFESSORES E ALUNOS DA ESCOLA NO CAMPO NO INTERIOR DE
ALAGOAS (UM ESTUDO DE CASO)
Elâine Fernandes dos Santos - UNEAL
elaine.vip@hotmail.com
Josefa Mendes da Silva- UVA
josefa.uneal@hotmail.com
Antônio Barbosa Lúcio - UNEAL
ablucio1@yahoo.com.br
Resumo
Este trabalho tem por objetivo mostrar os resultados de uma pesquisa bibliográfica e de campo que
revela a realidade da educação no campo, particularmente, da escola Deraldo Campos localizada
na zona rural de São Sebastião/AL. Dessa forma, busca-se evidenciar a realidade das escolas do
campo, no interior de Alagoas, e oferecer informações sobre algumas particularidades acerca do
processo ensino-aprendizagem, funcionamento e condições socioeconômicas de seus alunos.
Palavras chaves
: educação, educação no/do campo, sala multisseriada.
1.0 Introdução
Este trabalho tem por objetivo mostrar os resultados de uma pesquisa bibliográfica e de campo que
revela a realidade da educação no campo, particularmente, da escola Deraldo Campos localizada na
zona rural de São Sebastião/AL. Dessa forma, busca-se evidenciar a realidade das escolas do
campo, no interior de Alagoas, e oferecer informações sobre algumas particularidades acerca do
processo ensino-aprendizagem, funcionamento e condições socioeconômicas de seus alunos. A
educação do campo, no Brasil, sempre ficou em segundo plano. É fácil chegar a essa conclusão ao
se analisar as condições das escolas localizadas nesta área: a maioria delas encontra-se em locais
isolados; a estrutura física, geralmente, encontra-se em péssimas condições; a maioria dos
professores tem que se deslocar da cidade para o campo; salas multisseriadas; falta de merenda
escolar, isso sem falar que essas escolas estão praticamente abandonadas. Dentre outros fatores.
A necessidade de se pensar em uma educação voltada para o campo é muito importante se
pensarmos na realidade da sua população, e também no fato de que a maior parcela dos estudantes
da zona rural sequer chegará a concluir o ensino médio. O que implica dizer que os mesmos se
dedicarão ao trabalho rural como têm feitos os seus pais, avós, não por opção, mas por ausência de
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condições mínimas de sobrevida. Geralmente, acredita-se que para viver na “roça” não é preciso ter
muitos conhecimentos. Essa ideia mostra que para os trabalhadores do campo, ter uma formação
escolar não é tão importante quanto para os que vivem na cidade. É fácil observar o descaso
oferecido aos estudantes da zona rural. Suas escolas são geralmente multisseriadas, o que deixa
muito a desejar quanto à eficácia do ensino lá ministrado.
Pensar em uma educação voltada para os trabalhadores da zona rural requer a compreensão de que
sua população, como a urbana, é demandante de direitos. Assim, tem-se a necessidade de uma
educação que corresponda aos interesses dos trabalhadores do campo. Então, são necessárias
políticas públicas de educação adequadas às necessidades diárias dessa gente valorizando sua rica e
importante contribuição para a sociedade, tendo em vista que o campo não é um lugar de atraso,
como muitos podem pensar, mas de produção: cultural, social, política e econômica.
Neste artigo utilizamos depoimentos colhidos com 05(cinco) alunos e as 02(duas) professoras que
trabalham no 4° e o 5° ano do ensino fundamental, da Escola Deraldo Campos, que se dispuseram a
responder os questionários da pesquisa. Demonstraremos que é precária a situação da escola em
questão denunciando o decorrente descaso do qual essa e tantas outras escolas da zona rural são
vítimas: não há salas suficientes para comportar cada uma das séries oferecidas pelo
estabelecimento; a sala de aula é multisseriada; merenda insuficiente e de baixa qualidade; falta de
material didático adequado e atualizado; capacitação dos professores. Dentre outros fatores que
tornam quase inviável a oferta de um ensino de qualidade.
1.0 O problema da Educação do Campo
Quando falamos em educação do/no campo não estamos propondo a criação de um tipo próprio de
escola para o campo, mas sim de um ensino que deveria ser mais flexível e culturalmente adaptado,
tanto no campo como na cidade. Percebe-se que a educação atual no campo está voltada para a
alfabetização dos jovens e não centrada no fator educar, em seu sentido amplo. O modelo atual da
educação no campo não prepara as crianças para a vida no mundo urbano nem para o mundo no
campo. É uma educação que prepara esses novos cidadãos para serem submissos à lógica do
capitalismo. Ou, para mais tarde serem apenas explorados. Esse mesmo modelo de educação parece
colaborar com o processo de expulsão dos jovens do campo fortalecendo o ciclo vicioso que estes
têm realizado: ou sair do campo para estudar ou estudar para sair do campo (BENJAMIN e
CALDART, 2000; GENTILI e McCOWAN, 2003
Apud MION e JESUS, 2005; ESTEVAM, 2010).
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A maioria dos estudantes oriundos da zona rural não consegue concluir sequer o ensino médio. Este
fato pode ser demonstrado a partir de dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP, 2008) que demonstram que em Alagoas apenas a cidade de
Girau do Ponciano possui 01 (uma) escola de ensino médio no campo. O censo escolar de 2008
demonstra que o ensino fundamental na rede pública municipal do campo em São Sebastião teve
2.673 alunos matriculados nos anos inicias, mas destes apenas 1.306 chegaram a finalizar o ensino
fundamental na cidade. Diante destes dados, percebe-se que sob a lógica do governo de Alagoas, o
ensino fundamental ainda pode ser realizado no campo, mas o ensino médio deve estar sempre na
cidade. Assim, a falta de escolas no ensino médio é fator agravante. Assim, quanto mais elevado o
nível de ensino, diminui o número das escolas que oferecem este nível e, os alunos precisam ir para
a cidade. Entretanto, as dificuldades são muitas: dentre elas, a questão do transporte que muitas
vezes não chega a alguns povoados distantes, por vários motivos, como por exemplo, a questão das
estradas que ficam em péssimas condições no período das chuvas. Mas, existem outros fatores que
dificultam e/ou comprometem a aprendizagem nas escolas do(no) campo, pois:
o nível de escolaridade dos professores revela, mais uma vez, a condição de carência da zona
rural. No ensino fundamental de 1ª a 4ª série, apenas 21,6% dos professores das escolas rurais
têm formação superior, enquanto nas escolas urbanas esse contingente representa 56,4% dos
docentes. O que é mais preocupante, no entanto, é a existência de 6.913 funções docentes sendo
exercidas por professores que têm apenas o ensino fundamental e que, portanto, não dispõem da
habilitação mínima para o desempenho de suas atividades. A maioria desses professores leigos
atua nas Regiões Nordeste e Norte (MEC/INEP, 2007: 33).
Logo, percebe-se que o fato das escolas brasileiras, principalmente as localizadas no campo,
apresentarem precárias condições para o seu funcionamento como, por exemplo, classes
superlotadas, classes multisseriadas, desvalorização social dos professores, insuficiência de
materiais didáticos, e, ainda, boa parte dos professores não tem domínio de conteúdos e
metodologias, estes fatores ao lado das péssimas condições em que vive o aluno, são responsáveis
pelo
déficit dos resultados em relação à educação urbana. Essa realidade aponta para o fato de que,
há muito, a educação do campo vem sofrendo as consequências da falta de comprometimento e
responsabilidade dos órgãos responsáveis pela gerência da Educação no Estado Brasileiro. Este, por
sua vez, garante que medidas e projetos já estão sendo postos em prática, como por exemplo, as
Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo, documento elaborado pelo
Conselho Nacional da Educação e aprovado em 2001, onde são estabelecidas as especificidades e
leis que garantem às escolas do campo um ensino de qualidade e condizente com a realidade de sua
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população. Mas, na prática, diante da realidade das escolas no campo esses projetos e leis - dentre
outros - parecem não surtir efeitos ou mesmo que possam ser sentidos na realidade pesquisada.
1.1 A Educação no Campo em Alagoas
Em Alagoas, a situação da educação no campo parece ser ainda mais grave considerando que o
Estado é, essencialmente, rural. O resultado do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(IDEB) para 2009 demonstrou que o Estado está entre os piores índices do país, com nota igual a
3,7 abaixo da média nacional que é 4,2. E, a situação pode ser ainda pior uma vez que as escolas do
campo, geralmente ficam fora das pesquisas realizadas. A falta de um modelo de educação voltado
para as especificidades do campo faz com que muitos jovens abandonem os estudos por não
reconhecerem nos ensinamentos recebidos características condizentes com a realidade em que
vivem. E, muitos outros também acabam percebendo que a única forma de continuar os estudos é
adaptando-se a ideia que muitas vezes o modelo de educação atual deixa transparecer: de que a
cidade é superior ao meio rural. Pois,
apesar de o Brasil ser um país de origem eminentemente agrária, a educação
rural aqui nunca
foi alvo de interesse dos governantes, ficando sempre
relegada a segundo ou terceiro plano,
"apêndice" da educação urbana. Foi e é uma educação que se limita à transmissão de
conhecimentos já elaborados e levados aos alunos da zona rural com a mesma metodologia
usada nas escolas da cidade. Não se faz relação com a vida dos alunos e de sua família, com o
trabalho agrícola nem com o meio ambiente em que a escola está inserida. [...] e ignoram-se os
conhecimentos que as crianças já trazem consigo para a escola (BAPTISTA, 2003:20-21)
(Grifos do autor).
Dessa forma, a identidade camponesa desses alunos vai desaparecendo gradualmente. Essa
identidade é caracterizada pelas lutas diárias que essa população enfrenta em sua luta pela igualdade
de direitos. Nessa perspectiva, geralmente não sendo um trabalhador rural, o educador que vive,
sente e convive com eles, torna-se companheiro nas lutas diárias de seus alunos. E também acaba se
identificando com os seus viveres, saberes e prazeres, tornando-o co-participante do ato de educar
no e para o campo. Mas para tanto, necessitaria de formação adequada que lhe propiciasse
condições efetivas de desenvolver atividades que possam relacionar os conteúdos trabalhados com o
mundo em que vivem os alunos.
1.2 A situação da educação do campo no Brasil.
A Educação do camponês no Brasil sempre ficou em segundo plano, talvez porque desde o
feudalismo a elite dominante sempre tenha visto os camponeses como seus submissos, portanto não
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dignos de ter algum conhecimento científico, geralmente devido a concepção ideológica que
fundamenta o sistema capitalista, que lucra mais quando os indivíduos desconhecem os seus direitos
e não reivindicam melhores condições de trabalho e vida.
Quando circulamos pelo campo percebemos como os prédios das escolas dessa área são, em sua
maioria, de pequeno porte com uma ou duas salas de aula e quase todas oferecem ensino
fundamental de 1º ao 5º ano. Muitas escolas possuem turmas multisseriadas, o que, segundo o INEP
(2005) correspondia a 56%das escolas da região nordeste com um único professor responsável pela
aplicação do conteúdo didático para as quatro séries. Além da sobrecarga de trabalho desses
profissionais e das más condições de trabalho, o salário para os professores da zona rural tende a ser
menor comparado ao salário dos professores da rede urbana, pois segundo dados do INEP (2007) os
professores do campo recebem 60% a menos do que os professores urbanos. Isto acontece, talvez,
porque esses professores não possuam qualificação profissional considerada adequada ou porque os
prefeitos não valorizam a educação e, o Estado brasileiro se omite diante os problemas com
educação. A união de todos esses fatores contribui para o mau desempenho dos alunos e a
desistência dos mesmos:
[...] o problema das turmas multisseriadas está na ausência de uma capacitação específica dos
professores envolvidos, na falta de material pedagógico adequado e, principalmente, a ausência
de infra-estrutura básica – material e de recursos humanos – que favoreça a atividade docente e
garanta a efetividade do processo de ensino-aprendizagem. (...) (INEP, 2006:19
Apud SECAD,
2007: 22).
Ora, o INEP, ao invés de admitir que o problema das turmas multisseriadas estaria no fato delas
existirem, passam a culpabilizar outros fatores, é verdades, agravantes, mas sem conotação direta
com a questão fundamental do por quê existir escolas com tal modalidade de ensino. A questão
principal estaria no descaso público em garantir escolas de qualidade tanto no setor urbano como
rural atendendo a estes últimos às peculiaridades do campo.
Outro problema que afeta diretamente estes estabelecimentos é a falta de recursos financeiros que
possam ser aplicados corretamente. A ausência de uma administração competente e que saiba usar
com responsabilidade os recursos direcionados para essa área também afeta o desenvolvimento
desse setor. O descaso com a educação do campo envolve ainda muitos outros problemas que, para
a população camponesa, são desconhecidos por falta de informação, bem como, a falta de
assistência e supervisão pedagógica e também de um calendário escolar que se adeque às
necessidades dos sujeitos do meio rural, como estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação:
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Art. 28º
. Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino
promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada
região, especialmente: I
- conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais
necessidades e interesses dos alunos da zona rural; II
- organização escolar própria, incluindo
adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas; III
-
adequação à natureza do trabalho na zona rural (MEC/LDB 1996: art.28).
Toda essa discussão acerca dos problemas sobre a educação no campo revela a preocupação que
existe em valorizar a população que vive no campo, pois,
(...) quando discutimos a educação do campo estamos tratando da educação que se volta ao
conjunto dos trabalhadores e das trabalhadoras do campo, sejam os camponeses, incluindo os
quilombolas, sejam as nações indígenas, sejam os diversos tipos de assalariados vinculados à
vida e ao trabalho no meio rural. (CERIOLI & CALDART (2004: 25)
Apud ANTONIO e
LUCINI, 2007: s/p).
Ou seja, a educação do campo deve ser pensada em função das necessidades e peculiaridades que a
vida no campo exige. Independente de cor, raça, sexo, idade ou religião. Pois, a população
camponesa, assim como a urbana, também é demandante de direitos e deve ter acesso a uma
educação que
seja e esteja vinculada a realidade em que esta gente está inserida.
1.3 Análise da Escola de Ensino Fundamental Deraldo Campos (São Sebastião/AL)
Impulsionadas pela discussão sobre a Educação do Campo, visitamos uma escola da zona rural com
o intuito de verificar qual a situação em que se encontrava sua estrutura física e investigar junto aos
alunos e professores quais as principais dificuldades enfrentadas. A realidade com que nos
deparamos foi a já citada anteriormente: estrutura física deteriorada, poucas salas de aula,
professores tendo que se deslocar da cidade para o campo, turmas multisseriadas, dentre outras. A
escola Deraldo Campos (foto 01, abaixo) está localizada no povoado Taboquinha, município
pertencente à cidade de São Sebastião/AL, possui três salas, das quais uma é utilizada como sala de
leitura. Sua estrutura física está deteriorada, as paredes estão sujas, o piso gasto, as cadeiras sujas e
quebradas. Na sala de leitura (foto 02, abaixo) verificamos que os poucos livros existentes são
velhos, desatualizados e mal organizados. Além disso, não há condições razoáveis de se trabalhar
com uma quantidade elevada de alunos na sala de leitura, que também funciona como sala de aula,
pois não há cadeiras suficientes para acomodar um número maior de pessoas, o que dificulta o
trabalho das professoras. De acordo com as professoras são os alunos do 5° ano que mais utilizam
os livros disponíveis, embora todos tenham acesso a eles. A falta de biblioteca e livros atualizados
disponíveis que possam auxiliar e incentivar o gosto pela leitura e pesquisa é um dos problemas
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corriqueiros existentes na maioria das escolas localizadas no campo, pois dados do INEP/MEC
(2007), demonstram que 94,8% das escolas localizadas nesta área não possuem biblioteca.
Foto N° 01: Escola Deraldo Campos, Sítio Taboquinha, São Sebastião – Alagoas.
Fonte: Santos; Silva; Lúcio, 29/09/2009.
Foto N° 02: Interior da Sala de Leitura da Escola Deraldo Campos - Sitio Taboquinha - São
Sebastião/AL
Fonte: Santos; Silva; Lúcio, 29/09/2009.
Dos cincos professores da escola, foram entrevistadas as professoras: Carmem Lúcia dos Santos, 33
anos, e Valdinete Batista dos Santos, 37 anos, ambas com formação superior em Pedagogia pela
Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL). As entrevistadas afirmaram que a escola não possui
equipe técnica de apoio e nem conselho escolar, mas a secretaria de educação oferece esse apoio à
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escola. São feitas reuniões bimestrais com os pais dos alunos que comparecem em sua totalidade
quando as reuniões acontecem fora do período de plantio. Segundo os relatos das professoras, não
há eleições para equipe administrativa que, na escola, se resume a direção geral, então, esse cargo é
ocupado por indicação política.
A professora Carmem Lúcia dos Santos, que também é a responsável pela direção da escola, explica
que quando assumiu o cargo (março de 2009) a situação era bem pior, pois de acordo com os seus
relatos, não havia sala de leitura, a participação dos pais nas atividades da escola era menor, a
comunidade participava menos da vida da escola. Quando questionadas sobre o uso de recursos
tecnológicos na escola, as entrevistadas relataram que o único recurso desse tipo disponível é um
pequeno microssistem, que, vez ou outra, é utilizado. Acreditam que se a escola possuísse recursos
para além dos que existem, as aulas seriam mais proveitosas e interessantes para os alunos, como
relata a professora Valdinete Batista dos Santos: “o uso da tecnologia na sala de aula é com certeza
importante, porque incrementa a aula do professor, o conteúdo chamaria mais a atenção e não seria
a mesma coisa todos os dias (Valdinete Batista dos Santos, professora da zona rural/São Sebastião-
AL em 29/09/2009)”.
A falta de recursos tecnológicos é só um dos muitos problemas que os professores, dessa e de outras
tantas escolas da zona rural têm que enfrentar. Esses recursos tecnológicos seriam apenas materiais
de apoio para tornar as aulas mais práticas. Mas, o que se pode perceber é que não falta apenas este
tipo de material, os únicos recursos que a escola possui são a lousa e o giz, além de alguns livros
usados. Há também o problema da alimentação na escola. Segundo os entrevistados, a alimentação
distribuída pelo poder público é o suficiente apenas para, em média, 15 dias e até que chegue uma
nova remessa eles têm que esperar certo tempo, além disso, não seria considerada por eles de boa
qualidade.
Uma das professoras entrevistadas também falou sobre os cursos de capacitação oferecidos pela
rede pública e deu sua opinião sobre os mesmos:
os cursos de capacitação precisam ser melhorados, principalmente os instrutores que não têm
total conhecimento do conteúdo. Precisa-se de pessoas que tenham domínio do assunto. Nós
utilizamos os conteúdos dos cursos para aperfeiçoar nossas aulas, mas nem sempre isso é
possível, trabalhamos de acordo com as nossas capacidades, uma vez que, nas capacitações
existe todo um material, uma realidade diferente da sala de aula. Na sala de aula o professor tem
que transformar o que aprendeu em algo que ele possa utilizar (Carmem Lúcia dos Santos, 33,
professora da zona rural/São Sebastião-AL em 29/09/2009).
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Com base nos depoimentos das professoras, pode-se perceber a preocupação delas em fazer o
possível para manter seus alunos na escola. Mas, as dificuldades são, de fato, imensas. Pelos os
dados coletados, podemos verificar que a situação sócio-econômica das famílias dos alunos é
precária. Muitas vezes a merenda parece ser a única refeição que eles têm no dia.
Visando aperfeiçoar suas aulas, as professoras entrevistadas afirmaram que se vêm na necessidade
de buscar fora da escola recursos didáticos que prendam a atenção dos alunos, pois o poder público
não fornece. A necessidade de estimular os alunos a participar ativamente da aula, é a alegação
utilizada pelas professoras entrevistas que tiram o dinheiro do aproximadamente de R$ 840,00
mensais que recebem como docentes. É importante salientar o fato de que as professoras lecionam
em salas multisseriadas onde têm que trabalhar com conteúdos distintos, com alunos que cursam o
4° e o 5° ano do ensino fundamental. As turmas possuem entre 14 e 15 alunos com idades que
variam entre 08 e 11 anos. Essa situação tende a ser desfavorável para o aprendizado, devido à
dificuldade em trabalhar conteúdos diferenciados sem condições básicas de ensino, além do fato,
como dito anteriormente, que as professoras não recebem apoio pedagógico frequente para
desenvolverem as disciplinas que lecionam.
Foram entrevistados cinco alunos com idades entre 08 e 11 anos, todos moram com a família e nas
proximidades da escola. Em todos, percebe-se o interesse pelos estudos, embora 40% tenha se
mostrado mais tímidos quando interrogados. Para as crianças entrevistadas a escola é o lugar para
onde elas vão para aprender a ler e escrever. Quanto às questões relacionadas ao conteúdo estudado
em sala de aula 40% dos entrevistados relatou não ter dificuldades, já os outros 60% confessaram
que encontram dificuldades nos momentos de leitura por ainda não saberem ler muito bem. Então
têm que repetir a leitura várias vezes o que torna a atividade chata, relataram eles. Note-se que
estamos relatando situações com alunos do 4º e 5º ano que, demonstram não conhecer o suficiente
para leitura de um texto.
Na visão dos alunos entrevistados a escola tem grande importância em suas vidas, pois quando
perguntados se pretendiam dar continuidade aos estudos todos responderam que sim. Mesmo sendo
bem jovens, essas crianças demonstraram pensar no futuro, como sugestões de profissões futuras
foram citadas por elas: Médico, Policial e Professor. Todas as crianças entrevistadas reclamaram da
estrutura da escola e da falta de alimentação. Em relação às aulas 20% deles acha que a professora
fala demais e devia brincar mais; 20% consideram que as aulas são boas; outros 20% relataram que
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os exercícios aplicados são muito fáceis e 40% que seria bom trabalhar mais com textos enfatizando
a leitura.
De acordo com os depoimentos dos alunos há um bom relacionamento entre eles e suas professores,
embora vez ou outra surja alguns desentendimentos. Desses estudantes 60% confessaram trabalhar
com seus pais no cultivo do fumo e em outras atividades agrícolas. Este fato foi relatado também
pelas professoras entrevistadas. Das crianças entrevistadas nenhuma aceitou de bom grado a ideia
de ter que se deslocar para a cidade para continuar estudando. Para elas viver e estudar no campo
significa ser livre para correr, brincar com seus amigos. Além disso, suas famílias podem plantar
algumas hortaliças e verduras; não precisam comprar tudo. Para eles, o campo representa um espaço
de liberdade enquanto que a cidade é vista como um espaço de restrições: “Minha vida aqui é boa
porque eu tenho a liberdade para andar e espaço para brincar. Acho que viver na cidade é ruim,
porque eu vou ficar trancado e sozinho, aqui eu tenho meus amigos e primos para brincar (José
Carlos da Silva, 10, estudante, em 03/10/2009)”. Como é possível perceber, existe uma visão
romantizada do campo e, outra negativa dos centros urbanos. A representação social que os
entrevistados possuem do campo, geralmente idealizada, não condiz com a realidade, pois, de uma
forma ou de outra, a violência estaria presente. E, mesmo se não houvesse, as condições de vida e
de trabalho em que estão inseridos, não propiciaria essa suposta “felicidade” defendida pelos
entrevistados. Pois,
é comum confrontar-se zona urbana e rural atribuindo à vida na zona urbana o fortalecimento do
individualismo, do egoísmo, e pensando a vida na zona rural como fortalecida por relações de
cooperação, forjando pessoas melhores, mais solidárias e atentas às necessidades do outro
(MARTINS, 2003:567).
De acordo com 80% dos alunos entrevistados, a cidade apesar de suas vantagens é um lugar distante
de seus amigos, e, que indo morar lá irão perder a liberdade que possuem morando no campo. Notese
que, possivelmente, a cidade que os entrevistados estariam falando, São Sebastião, possui de
acordo com o IBGE (2010) 32.007, dos quais 12.306 habitantes residem na sede do município e,
19.701, na zona rural. Possivelmente, a maior cidade que conhecem, seria Arapiraca, também no
agreste alagoano, com uma população total de 214.067, dos quais, 181.562 residem na sede do
município e, 32.505 na zona rural, ou seja, ambas não são grandes centros urbanos. Portanto,
prevalece uma visão fictícia dos centros urbanos. Apesar disso, os alunos entrevistados, reconhecem
que há a necessidade de ir estudar nas escolas urbanas, pois estas possuem ensino de “melhor
qualidade” sem, entretanto, saber demonstrar o que ou como seria essa suposta qualidade. E, além
do mais, segundo dados do INEP (2010), o nível de ensino ofertado nas escolas no campo de São
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Sebastião limita-se ao nível fundamental, o que impulsiona esses alunos a procurarem as escolas da
cidade para continuarem estudando. Os outros 20% disseram querer ir morar na cidade, mas
apontaram à escola do campo como sendo melhor que a da cidade. Isso revela a falta de
conhecimento quanto às disparidades existentes entre o ensino ministrado nas escolas da zona
urbana e a rural.
A partir das entrevistas com os alunos, percebemos a ideia de sair do campo para a cidade, mesmo
que para estudar, desagrada. Pois, é no campo que eles se identificam e se reconhecem
considerando a estreita relação que mantêm com seus colegas e familiares. É no processo do
cultivar, semear e colher que eles constroem as suas perspectivas. Embora reconheçam que na
cidade encontrarão uma educação com mais qualidade que lhes permitirá a busca pelas carreiras
profissionais almejadas é no campo onde eles se identificam, vivem.
Sabemos que as barreiras são muitas, pois a educação no campo é foco de pouca atenção e,
podemos perceber isso, considerando o relato de quem vive essa realidade, como as professoras
entrevistadas, personagens ativas que percebem o distanciamento existente entre o nível de ensino
das escolas rurais para as urbanas. Pois, quando indagadas acerca das principais dificuldades que
encontravam em sala de aula e na escola em geral, a professora Valdinete Batista respondeu:
acho que a escola da zona rural é muito diferente da da zona urbana, porque a da zona rural fica
um pouco esquecida pelo pessoal da secretaria, a da cidade é mais visitada e aqui só exigem do
professor, mas eles que deveriam ajudar o professor, não há essa ajuda, esse interesse para com
a gente
(Valdinete Batista dos Santos, professora da zona rural/São Sebastião-AL em
29/09/2009)
.
O relato da professora demonstra o descaso existente para com as escolas do campo salientando o
fato de que, para a entrevistada, as escolas urbanas são priorizadas em detrimento das da zona rural
ficando, mais uma vez, o campo subordinado à cidade. Voltando à análise dos depoimentos das
professoras perguntamos qual a opinião delas sobre os cursos de capacitação de que participavam e
se utilizavam os conteúdos destes em suas aulas:
os cursos de capacitação precisam ser melhorados, principalmente os instrutores que não têm
total conhecimento do conteúdo. Precisa-se de pessoas que tenham domínio do assunto. Sim,
mas nem sempre. Trabalhamos de acordo com as nossas capacidades, uma vez que, nas
capacitações existe todo o material, uma realidade diferente da sala de aula. Na sala de aula o
professor tem que transformar o que aprendeu em algo que ele possa utilizar (Carmem Lucia
dos Santos, 33, professora da zona rural/São Sebastião em 29/09/2009).
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Essa realidade relatada pela professora Carmem Lúcia sobre os cursos de formação continuada
contradiz aquilo que o art. 26 da LDB/96 estabelece:
art. 26. Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a
ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte
diversificada,
exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da
economia e da clientela
(LDB, 1996: Art.26) (Grifos nossos).
A LDB estabelece que os currículos do ensino fundamental e médio devem adequar-se às
características regionais e locais de cada sociedade levando em consideração a cultura e economia
regionais. Mas, na realidade, isso não acontece como se pode perceber pelas falas da professoras
entrevistadas ao relatarem as dificuldades que enfrentam em sala de aula por terem que adaptar os
conteúdos propostos à realidade de seus alunos.
Outro aspecto negativo existente nas escolas do campo refere-se aos livros didáticos que
apresentam conteúdos inadequados à realidade dos alunos, como relata a professora Carmem Lúcia
acerca da utilização deste em suas aulas. A entrevista diz que utiliza, “porém, não com muita
frequência. Existem conteúdos importantes que não existem no livro. O livro é muito restrito”. Essa
restrição a que ela se refere estaria relacionada às características regionais e locais dos alunos e
ainda com a realidade em que estes estão inseridos.
Durante a entrevista perguntamos como elas acompanhavam o processo de ensino-aprendizagem
dos alunos, como avaliavam sua aprendizagem e quais as principais dificuldades de aprendizagem
que eles apresentavam:
através de avaliação para ver como é que anda sua aprendizagem; pelas atividades, pois as
provas foram abolidas, então é preciso avaliar tudo; o comportamento. Antes os alunos eram
mais concentrados. Hoje eles parecem não querer nada com a vida. O professor tenta fazer o
máximo, mas o aluno não tem interesse (Valdinete Batista dos Santos, 37, professora da zona
rural/São Sebastião em 29/09/2009).
Diante o depoimento da professora percebe-se que há uma preocupação de sua parte em levar aos
alunos um pouco de conhecimento que os permita ampliar sua visão de mundo. Mas, a
despreocupação por parte desses aliada a limitação de materiais didáticos adequados que pudessem
auxiliá-la na aula não permitem que isso aconteça de forma ampla e eficaz. Uma vez que, na escola
estudada não existe uma biblioteca com livros atualizados, como já citado, e, também, não há
recursos tecnológicos que possam facilitar a explanação de assuntos a serem trabalhados em sala de
aula.
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Os órgãos responsáveis pela gerência da educação parecem ignorar a situação precária em que se
encontra a educação no campo. Pois, embora existam leis que garantam a aplicação de recursos
nesta área e a adequação dos currículos e calendários às peculiaridades regionais e culturais dessa
população, na prática isso parece não acontecer. Em Alagoas, a Gerência de Educação do Campo
(GEDUC) da Secretaria de Estado da Educação e do Esporte de Alagoas (SEE), diz realizar
atividades ligadas à educação do campo. Mas, perante a realidade alagoana parece não produzir
efeitos ou mesmo que possam ser sentidos na realidade pesquisada. Além disso, há uma dissociação
entre o ensino praticado pela rede pública estadual e municipal, o que pode explicar, os professores
entrevistados desconhecerem formas de trabalhar voltada para a realidade do campo.
Nas entrevistas fizemos a seguinte pergunta às professoras: Em sua opinião quais seriam as
especificidades da Educação do Campo? Obtivemos as seguintes respostas: “trabalhar a realidade
do aluno, o que ele vive, o que ele conhece. Deveria haver material didático voltado à realidade
dele, a capacitação dos professores também deveria ser de acordo com a realidade deles (Carmem
Lucia dos Santos, 33, professora da zona rural/São Sebastião em 29/09/2009)”.
E, a outra
entrevistada diz:“
é muito importante. Depende do conteúdo. Como a realidade da cidade é
diferente da do campo os assuntos trabalhados deveriam estar de acordo com cada uma dessas
realidades (Valdinete Batista dos Santos, 37, professora da zona rural/São Sebastião em
29/09/2009)”. Estes depoimentos salientam, mais uma vez, a realidade descrita anteriormente:
embora haja leis que garantam uma educação de qualidade para a população camponesa, na prática,
isso não acontece, mas também aponta que as entrevistadas esperam que os assuntos venham
prontos, que os livros didáticos, resolvam a discrepância campo x cidade, sem, entretanto, perceber
que a realidade estaria a sua volta.
Diante dos dados e depoimentos expostos aqui percebemos que a problemática da educação no
campo pode ser ainda mais grave considerando que, geralmente, as escolas localizadas nesta área
ficam fora das pesquisas realizadas por órgãos governamentais ou, simplesmente, como no caso de
São Sebastião, não existem pesquisas. E, embora haja projetos e leis que se mostram preocupados
com a preocupante realidade do campo, são necessários também governantes engajados nessa luta,
que se comprometam a lutar pela efetivação dessas leis garantindo à população rural acesso a uma
Educação de qualidade. Pois, a Educação
sendo, portanto, função do Estado, cabe-lhe, a este, proporcioná-la, de tal forma que nenhuma
classe social seja excluída do direito de beneficiar-se dela e ainda de tal forma que ela não
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constitua privilégio de uns em detrimento de outros, devendo ser ministrada de forma geral,
comum e igual (ROMANELLI, 1998:31-32
Apud ALMEIDA, 2009: 284).
Ao finalizar as questões sobre a prática em sala de aula pedimos que as professoras fizessem uma
explanação sobre como a Educação poderia melhorar e acrescentar qualquer outra informação,
comentário ou sugestão, obtivemos as seguintes respostas:
acho que através da participação da comunidade poderia melhorar um pouco, e também, que os
representantes, como o prefeito, por exemplo, sentisse vontade de melhorar isso. Percebe-se que
o presidente tem pensado na Educação, mas os prefeitos, secretarias, ainda não fazem quase
nada para melhorar esse quadro. Eles deviam se dar conta de que primeiro, pra escola funcionar,
tem que vir o recurso de lá para suprir as necessidades (Valdinete Batista dos Santos, 37,
professora da zona rural/São Sebastião em 29/09/2009).
E, a outra entrevistada, diz:
eu acredito que a tendência é piorar. A gente percebe alguns avanços, mas poderia melhorar a
qualidade dos profissionais. Eu acho que a base seria investimento na educação infantil, não tem
como você construir uma casa começando pelo telhado se há profissionais despreparados. Eu
acredito que deva-se a isto (Carmem Lucia dos Santos, 33, professora da zona rural/São
Sebastião em 29/09/2009).
Diante destes depoimentos, vê-se que as entrevistadas têm conhecimento da falta de atenção dos
órgãos públicos governamentais para com a Educação no Campo, e que compreendem que estes
parecem ignorar a situação de caos predominante nas escolas do campo. Quando na realidade
deveria haver projetos eficazes que garantissem o acesso e permanência dos camponeses na escola.
Mas, na realidade
muitas são as adversidades que acompanham a educação rural. Poucas e precárias escolas,
distantes umas das outras, dificuldades de comunicação, ausência de orientação metodológica e
didática, falta de verbas públicas na escolarização, deficiências na formação de professores,
currículos por vezes inadequados, poucos materiais pedagógicos, falta de livros, entre outros
(ALMEIDA, 2009: 286).
A autora acima aponta alguns dos indícios acerca das razões que causam a crescente dicotomia na
educação entre campo/cidade privilegiando as escolas urbanas em detrimento das escolas da zona
rural. As entrevistadas, também, detectaram possíveis problemas, mas, nos parece, diante a prática
do poder público, se sentem senão incapazes, pelo menos com dificuldades em realizar possíveis
melhorias na educação do campo.
Considerações Finais
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Considerando os pontos aqui abordados, os depoimentos colhidos e a análise do ambiente estudado,
percebe-se que há a necessidade de se encontrar meios eficazes que garantam a efetivação de uma
escola com qualidade para os indivíduos do meio rural, pois estes devem ser reconhecidos como
categoria social que cumpre papel importante no desenvolvimento da sociedade. No decorrer deste
estudo foi possível verificar que a escola estudada apresenta vários dos problemas apontados na
literatura pertinente: estrutura física deteriorada, principalmente no interior das salas de aula;
ausência de biblioteca; quantidade de merenda considerada insuficiente e de baixa qualidade; sala
de aula multisseriada, o que dificulta o trabalho das professoras e; ausência de material didático
com conteúdos voltados à realidade dos alunos, como relataram as professoras. E, embora elas
possuam curso de nível superior não foram preparadas para enfrentarem as dificuldades existentes
na educação do campo. Além disso, nos cursos de capacitação de que participam não há a
preocupação de se trabalhar conteúdos que estejam de alguma forma ligados à realidade dos alunos.
É importante citar ainda que as más condições socioeconômicas em que vivem os alunos no campo
interferem no desenvolvimento intelectual e permanência destes na escola.
Os problemas citados aqui se tornam mais graves pela ausência de políticas públicas eficazes que
garantam a efetivação das, tão comentadas, leis que estabelecem que a educação do campo deve
estar de acordo com as características regionais, locais e culturais da sociedade. O que na prática,
não acontece. Foi possível demonstrar essa realidade a partir da análise dos depoimentos das
professoras Carmem Lucia dos Santos e Valdinete Batista dos Santos que relataram não haver, na
escola onde lecionam nenhum projeto ou ação que, de fato, visem pôr em prática as leis que
garantem um ensino de qualidade às escolas do campo.
Diante de toda essa problemática vê-se necessário buscar formas de educação nas quais as
peculiaridades do campo sejam respeitadas. E, que a política de “adaptação” da educação seja
substituída de modo que, a cultura e o conhecimento de mundo que a população camponesa possui
sejam respeitados, reconhecendo o quanto essa gente foi e é importante para a construção da
economia do país. Por isso, é necessário garantir o acesso e permanência deles na escola, mas para
tanto é necessária a existência de políticas públicas de educação do/no campo.
Os resultados da pesquisa revelam que o acesso da população camponesa à escola é muito
importante, pois esta como qualquer outra sociedade também é demandante de direitos. As
dificuldades que os alunos da escola Deraldo Campos têm que enfrentar, como outros tantos Brasil
a fora, são consequência da desatenção dos órgãos públicos responsáveis pela gerência e aplicação
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dos recursos destinados à Educação e também da inércia do Estado brasileiro ante toda essa
problemática, o que, consequentemente, gera empecilhos que dificultam a oferta de uma Educação
de qualidade aos habitantes do campo. Ante essa realidade cheia de entraves gerados pela omissão
do Estado quanto à efetivação das leis que garantem a existência de uma educação do e para o
campo, nos resta mostrar aqui que o método de ensino hoje presente nas escolas do campo deixa
muito a desejar. E, salientamos ainda que a forma como tem se desenvolvido a educação nas escolas
do campo, não condiz com o modelo proposto pela LDB, na prática o que acontece é uma mera
adaptação dos conteúdos aplicados nas escolas urbanas para as camponesas.
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2).
Entrevistados:
Adrian Batista da Silva, 08 anos.
Diego dos Santos Silva, 11 anos.
Deusdete da Silva Santos, 11 anos.
José Carlos da Silva, 10 anos.
Walisson dos Santos, 08 anos.
Carmem Lúcia dos Santos, (Professora)33 anos.
Valdinete Batista dos Santos (Professora), 37 anos.
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